É um perfeito exemplo de artigo que informa, criticando a posição comumente adotada por outros textos sobre o aumento do endividamento do governo por aporte de 100 bilhões de reais ao BNDES. Ele explica o motivo do aporte (crise financeira mundial e risco de falta de crédito interno), explica que os bancos privados estavam se fechando a empréstimos (como ocorreu no mundo inteiro), informa a função do BNDES, explica que é praticamente a mesma de outros bancos estatais estrangeiros, como o americano Eximbank (crédito para a produção nacional com juros subsidiados, o que também importa em alguma dívida por lá), lamenta que o BNDES esteja sozinho na função de manter créditos de longo prazo para a área privada e torce para que isso não continue assim por muito tempo (hoje nos EUA, por exemplo, o Eximbank não fica sozinho nesta função, apesar de continuar com a parte de juros subsidiados, claro).
Veja por si mesmo e veja porque o Jornal do Commercio é um grande jornal informativo como apregoo. Reproduzi somente parte da coluna para efeito de demonstração de qualidade informativa.
"Antonio Machado:Questão obtusa - Jornal do Commercio - 22/07/2010
Arquétipo deturpado
Os críticos da atuação do BNDES, surgido no Brasil em 1952 pelas mãos de um dos grandes expoentes brasileiros do liberalismo, o já falecido Roberto Campos, crítico ferrenho do Estado esbanjador, e não do desenvolvimento, extrapolam para hoje os vícios do passado.
No auge dos governos militares, o BNDES se degenerou no banco de projetos delirantes do Brasil potência sonhado pela ditadura — e, enfim, em hospital de negócios privados falidos. É esse arquétipo que a crítica quer enxergar no BNDES do governo Lula, mas deturpa a preocupação, ao omitir o que teria acontecido ao país ao entrar na crise global se o investimento minguasse pela falta de crédito.
Temores infundados
Não há nenhuma evidência para temores como dos ex-presidentes do Banco Central e do BNDES, respectivamente, Gustavo Loyola e Luis Carlos Mendonça de Barros, ambos no governo FHC, de que surja uma “relação incestuosa” do Tesouro com a entidade hoje presidida pelo economista Luciano Coutinho. Eles falam da “conta movimento”, uma gambiarra da ditadura pela qual o Banco do Brasil provia o crédito rural com a emissão inflacionária de dinheiro pelo Banco Central.
A aberração, fechada no fim do governo Sarney, funcionava como um orçamento paralelo ao orçamento fiscal gerido pelo Tesouro. Não há tal concepção nos dois aportes do governo Lula ao BNDES, ainda que projetos assim financiados, como o início da exploração do pré-sal pela Petrobras, possam ser questionados. Qual seria a alternativa, se a banca internacional e local havia trancado o crédito?
O bombeiro na crise
O BNDES pilotado por Coutinho segurou a onda recessiva que ainda varre o mundo. A que custo? Em entrevista, ele disse que já mandou apurar o valor presente dos dinheiros emprestados pelo Tesouro.
É o certo. O custo não é linear, derivado da Selic atual, mas da prevista para o prazo médio dos financiamentos do BNDES, que passa de cinco anos, vis-à-vis a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), de 6% ao ano hoje, mais spread, cobrada nas operações incentivadas do banco (as demais são em condições de mercado). O subsídio de juros implícito, de qualquer forma, aparecerá no orçamento do Tesouro.
Esse é o custo contábil de que falam os críticos. Outro, omitido, é o custo social e econômico, caso o BNDES não tivesse agido como bombeiro dos investimentos. O ministro Guido Mantega afirma que a recessão teria sido devastadora. Mais: sem crescimento e com meta de inflação, levaria outra década para sairmos da estagnação.
Fim à solidão do BNDES
O período eleitoral e a transição para um novo governo estimulam o receio sobre como o BNDES manterá o fluxo de financiamentos para o investimento da indústria e a infraestrutura pública, se já agora o seu caixa está pressionado. Coutinho discute opções com Mantega.
Com o conhecimento dos candidatos presidenciais, também está em fase avançada um aprofundado estudo, conduzido por uma coalizão de empresários, banqueiros, economistas e juristas, como contribuição da sociedade para o futuro governo. Seu foco é o aumento gradativo do financiamento de longo prazo com fontes voluntárias, envolvendo da criação do mercado secundário de dívida privada à maior atuação do mercado de ações. Com pequenas reformas, o BNDES terá companhia privada, aliviando a sua solidão como financiador do crescimento."
Você sabe quando você vai ter acesso a uma informação didática como essa que eu selecionei acima, com poderação sobre o motivo das ações de governo, com foco na finalidade real e estratégica, para o mal ou para o bem, da ação governamental,mesmo que do PT, como no caso? Quando passar a ler o Antonio Machado. No Globo, dificilimamente um artigo deste seria publicado, a não ser, eventualmente, na Miriam. Mas do jeito que ele escreveu, com fria e livre análise dos prós (irriga o mercado que se ressentia de créditos por bancos privados) e contras (aumento de dívida governamental) do aporte de 100 bilhões ao BNDES? Não sei se nem na Miriam. Talvez nem por ela (talvez), mas pela edição do Jornal com certeza não seria publicado.
Por isso peço: quando houver notícia de aumento de dívida pública, não apedrejem junto com o primeiro jornal, principalmente se for o Globo, A folha ou O Estadão. Procure se informar sobre o motivo do aumento de dívida, a que se destinou, e quais as opções a esta medida havia na época.
O PROER, do Fernando Henrique, foi bom, porque salvou bancos de colapso e, melhor, salvou a poupança de milhares e milhares de brasileiros, talvez milhões. O aporte de 100 bilhões ao BNDES no governo LULA também foi bom e foi uma das medidas tomadas em função da crise econômica mundial. E hoje estamos com crescimento praticamente chinês e os europeus vão amargar por no mínimo uns 5 a 7 anos, talvez uma década. É como se diz: tudo tem custo. Bem-estar da população, criação de emprego, manutenção de emprego, normalidade financeira do mercado produtivo também têm custo. Convém somente ponderar o custo em função do benefício proporcionado pelo ato ou ação governamental.
EU acho que um aumento de 1%, 5% ou 10% na dívida pública, em meio à crise mundial, para manter todos os empregos de milhões de brasileiros, criar outros 1,5 milhão nos seis meses do ano de 2010 e garantir normalidade de mercado e continuidade de investimentos em infra-estrutura vale a pena. EUA e Europa aumentaram sua dívida em mais de 100%. EUA que tinha dívida de 40% (já foi 25% do PIB), hoje tem mais de 80% do PIB de dívida, Itália, mais de 100%, Japão que já teve 110%, hoje está com 200%, e nós? Subimos de 42% para 46%!! E devemos chegar ao fim do ano com 40%! Segundo a pior conta que o Globo fez, contando investimentos e crédito para a área privada: 67%... estamos mal? Acho que não. Acho que a medida de oferecer crédito através do BNDES foi ótima e o valor, em relação ao benefício, foi bom e de custo mínimo.
Obrigado mais uma vez Antonio Manchado. Obrigado mais uma vez Jornal do Commercio.
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