quarta-feira, 2 de março de 2011

Sarney, Presidência do Senado e Oligopólio Midiático

Como José Sarney não sai da presidência do Senado? Por que os governos de esquerda dos últimos 16 anos não conseguem deixar de ter o PMDB como aliado? Por que Fernando Henrique e o PSDB foram aliados do PMDB e o PT também o é? COmo o PMDB consegue se manter no poder sempre, independente de quem seja o Presidente da República e qual seja o seu partido?

Esta resposta somente me ocorreu depois de eu juntar duas informações importantíssimas com a ajuda do Le Monde Diplomatique, em um editorial que atentava para o monopólio das comunicações no Brasil (ano de 2010), e a partir de uma conversa com um amigo que me chamou a atenção para o fato de que todos os Presidentes do Senado sempre são do Nordeste e coincidentemente donos de direito de reprodução de sinal de televisão, em especial da Rede Globo em seus Estados.

Pessoal, veja, na Câmara dos Deputados a representação dos Estados é proporcional às respectivas populações, ou seja, quem tem mais população tem mais representantes. Os Estados mais populosos levam vantagem nesse critério, como São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia e Rio Grande do Sul (maiores colégios eleitorais do Brasil). Mas sua representação maior é muito compensada pela grande quantidade de Estados e diluição de sua bancada regional no número total de Deputados Federais, sem contar a divisão por bancadas partidárias, ideológicas e de interesses de representação que une deputados dos Estados mais populosos aos deputados de mesmo partido ou de bancada de representação de interesses econômicos, políticos e socias de outros Estados. Há um equilíbrio nesse cesto de gatos.

Agora, no Senado a configuração é distinta: cada Estado tem a mesma representação numérica de Senadores. Isto é correto. Mas na prática, como o Nordeste é a região que tem mais Estados, terminam por ter um bloco representativo grande que vota coeso e sempre pega a Presidência do Senado.

O que os une de forma incomum não são somente os interesses do Nordeste, o que seria salutar, mas o fato de serem de famílias que sempre dominaram politicamente seus Estados e por serem reduplicadores do sinal de televisão em seus Estados. Observem que coincidentemente os Presidentes do Senado sempre são do Nordeste, de famílias tradicionais de seus Estados e reduplicadores de sinal de televisão: José Sarney, do Maranhão/Amapá e Antônio Carlos Magalhães (falecido), da Bahia. Só aqui temos quantas Presidências do Senado exercidas (parecem que são reduplicadores do sinal da Globo)? Jáder Barbalho (SBT/TVS - veja http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:vc2HiMZaYWAJ:pt.wikipedia.org/wiki/TV_Eldorado_(Marab%C3%A1)+J%C3%A0der+Barbalho+e+sinal+da+globo&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br&source=www.google.com.br), do Pará e Renan Calheiros, de Alagoas parece que também possuem direito de reduplicar sinais de televisão. E um outro detentor de direito de reduplicar sinal da Globo, nordestino, já chegou até a Presidente: Collor, de Alagoas. Hoje é Senador.

Quero dizer que não há problema em a nossa maior Rede de Televisão privada crescer sua reprodução pelo País, nem as demais redes de televisão. Quero dizer que o fato em si de as famílias tradicionais nordestinas reconhecerem na posse desse direito de reduplicação um meio de investimento econômico não é qualquer problema. Também é importante dizer que o monopólio midiático no Brasil por parte da Globo (hoje em risco pelo crescimento da Record e Bandeirantes) também ocorreu por falta de concorrentes à Rede Globo e ao crescimento dela muito por causa da qualidade de produção e adaptabilidade de seus programa ao gosto do brasileiro. Isso gerou grande benefício nacional, tanto o crescimento dessa especial Rede de Televisão como esse espraiamento por todo o País, porque facilitou a comunicação entre todo o País e a difusão dos símbolos de identidade cultural brasileira.

Mas essa configuração de fatores hoje, principalmente por causa do fato de no Brasil ainda se deixar um mesmo grupo econômico possuir rede de televisão, rádio e jornal ao mesmo tempo, cria um oligopólio midiático no Nordeste que inibe a competição eleitoral, resultando na eterna eleição dos representantes dessas famílias tradicionais para o Senado e a manutenção do poder em indicar e eleger o Presidente do Senado. Esse mesmo grupo se encontra concentrado no PMDB e no DEM (antigo PFL).

Com isso, como o Presidente do Senado é estratégico para que o Presidente da República consiga concretizar seu projeto político desenhado para o País, e como o PMDB tem sempre grande votação popular e representantes tanto no Senado como na Câmara dos Deputados, muito também pelo fato de seus maiores líderes nordestinos possuírem poder político de fato em seus Estados, direito de reduplicação do sinal de televisão mais popular do País (TV Globo, em especial) e ainda poderem ter cadeias de jornal e rádio, gerando monopólio informativo que gera a sua própria eleição e a de seus correligionários, nenhum Governo que realmente queira realizar algo no País pode prescindir do apoio desses senhores do PMDB nordestino, cujo último grande representante, hoje, é o Senador do Amapá, José Sarney.

Por isso, senhores, se quiserem acelerar o processo de desconstrução dessa bancada de interesse monolítico, o que já está ocorrendo com o crescimento da educação, crescimento econômico e crescimento do interesse político popular, somente acabando com o monopólio midiático. Em nenhum país desenvolvido um mesmo grupo econômico pode deter concessão de televisão, rádio e jornal!!!

p.s.: a aliança clássica do PSDB de FHC foi com o PFL (hoje DEM), mas também com parte do PMDB. Além disso, apesar de o Nordeste ficar dividido entre PMDB e PFL, majoritariamente, e o PFL ser o berço das famílias tradicionais do Nordeste, o PMDB no Nordeste é dominado igualmente por parte das famílias tradicionais do Nordeste. O PMDB e DEM (antigo PFL) no Nordeste é como a divisão dos partidos romanos na Antiguidade: apesar de serem dois partidos, seus integrantes são da mesma elite. E a diferença de abordagem temática entre o Partido Popular romano (representado por Mário e Júlio César) e o dos Optimates (Representado por Silas e Pompeu) ainda era mais incisiva do que a que existe entre o PMDB e DEM nordestino atual. Sobre a aliança do PSDB com o PFL e parte do PMDB, durante a Presidência de Fernando Henrique, veja: http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:HW-R5CxSJewJ:educacao.uol.com.br/historia-brasil/ult1689u75.jhtm+alian%C3%A7a+PSDB+PMDB+fernando+henrique&cd=7&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br&source=www.google.com.br

2 comentários:

  1. Mário, um comentário que reforça exatamente o que você ressalta no "POST" é sobre um documetário produzido pela BBC Britânica no início da década de 90 (1993) que até hoje está proíbida a distribuição no Brasil, intitulada "Beyond Citizen Kane" traduzido para português como "Muito Além do Cidadão Kane".

    A obra faz alusão ao filme de Orson Welles "Cidadão Kane" baseado na história do magnata do jornalismo William Randolph Hearst, porém, no documentário o jornalista da BBC Simon Hartog critica o brasileiro Roberto Marinho e a influência política praticada pela sua Rede de empresas de comunicação.

    Bom, o terceiro bloco (a partir de 00:56:18) do documentário explica exclusivamente isso que você menciona no texto, talvez seja daí o fundamento da matéria do "Le Monde Diplomatique".

    No trecho mencionado, inicia-se comentando o fato da relevância política buscada pela Rede Globo, menciona a indicação de ACM para o Ministério no Governo Sarney após a morte de Tancredo, o caso NEC do Garneiro que foi quebrada pelo R.M., sobre a manipulação da eleição do Collor e a derrota do Lula, e, derradeiramente, menciona que a nova CF/88 retirava do poder do presidente as concessões, então, antes de vigorar Sarney concedeu 90 emissoras. Algumas para sua família e amigos. Ah! Globo rádio e televisão, é claro!

    Cidadão Kane era pintinho!

    Registra-se que até hoje esse documentário só pode ser visto na internet pois sua distribuição e comercialização está proíbida no Brasil. As empresas Globo na Europa acordaram com a BBC para a não distribuição portanto a sua exibição foram poucas.

    A briga para a sua exibição recomeçou há dois anos quando a Rede Record comprou os direitos sobre o vídeo da BBC e de Hartog. Ela fez isto em resposta da tentativa da Rede Globo desmoralizar a ligação "desleal" da Record com a IURD.

    Vale a pena assistir o documentário, ele está disponível ON-LINE pelo Google em:

    http://video.google.com/videoplay?docid=-570340003958234038

    (copie e cole o link)
    Abraços.

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  2. Fábio, como sempre, excelente comentário e contribuição para o blog e para nossos leitores.

    Esse documentário eu assiti em 1994, no IFCS/UFRJ (Instituto de Filosofia e Ciência Social da UFRJ), durante meu curso de Direito, a convite dos alunos de História ou Filosofia da época.

    Sempre quis ter acesso de novo ao filme. Muito obrigado.

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