quarta-feira, 7 de junho de 2017

Posição do Blog sobre as Diretas Já

Há proposta para alterar a Constituição permitindo que sejam conclamadas eleições diretas para Presidente da República, no caso da queda do Vice-Presidente, antes de iniciar o quarto ano de mandato presidencial.

É um absurdo se defender a subversão dos procedimentos constitucionais definidos pelos legisladores constituintes por casuísmo. Quem defende isso, ou não entende de segurança jurídica e de Constituição e premissas de um Estado Democrático de Direito ou está de má-fé querendo a volta de Lula a qualquer preço e ou a subversão de um sistema democrático que hoje subsidia e tornou possível a maior operação esterilizadora do processo político brasileiro: a operação Lava Jato.

Subvertendo a Constituição com essas Eleições Diretas, o grupo podre da política, do PSDB, PMDB, PT, PP e DEM, dentre outros partidos menores (na verdade quase todos) teriam outra chance de influenciar o rumo dos fatos jurídicos e políticos que hoje são tocados pelo desenrolar das operações lava jato e outras do gênero.

Nossa Constituição é boa e jovem. É necessário que ela permaneça em vigor do jeito que está por muito tempo, para que haja tempo para amadurecer. E o que significa isso? Significa que ela não teve tempo suficiente para ser debatida, regulada pelas casas legislativas. Há muitos artigos que dependem de complemento e regulamentação para ter eficácia plena para o Estado, sociedade e para o cidadão.

Além de não estar toda regulamentada, existem conflitos e imbróglios que somente são resolvidos quando há problemas institucionais e debates jurídicos, como os que existiram recentemente sobre procedimento do impeachment, sobre efeitos de uma condenação política de impeachment, sobre a legitimidade de se retirar o cargo da presidente Dilma, mas na parte in fine do parágrafo único do artigo 52 da Constituição da República, qual seja, "inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis".

Vejam, poderia o Presidente do Supremos Tribunal Federal fatiar a condenação em Senado para que fosse ponderado primeiro a perda de cargo e depois a inabilitação, por oito anos, par o exercício de função pública", como o Lewandowski fez? Não, em nossa opinião. O artigo 52, parágrafo único, da Constituição Federal é claro:

"Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;
(...)
Parágrafo único. Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis."

Está escrito "com inabilitação", ou seja, a inabilitação é consequência da condenação da perda do cargo. Não está escrito "e/ou inabilitação", o que daria margem para que se entendesse que há duas condenações a serem procedidas.

Só que a competência do processo de impeachment é do Senado. Em que medida pode o STF adentrar no tema sem arranhar a autonomia e competência constitucional do Senado?

Observe que não há resposta certa ou errada fácil. Somente o tempo e o debate sobre este problema sedimentará a "prática constitucional brasileira". Isso só é possível sem alterar a Constituição.  Os problemas constitucionais e institucionais devem ser enfrentados. Isso é o que gera o amadurecimento da sociedade em relação à sua Constituição e suas instituições: a segurança, a estabilidade e a prática constitucional.

Ora, não é porque se cair o Temer ninguém quer ver o Rodrigo Maia na cadeira presidencial que se pode alterar a Constituição par impedir isso, por mais que não gostemos desse fato também. Não é porque não se quer que um Congresso elameado por mais de um terço de seus integrantes acusados e/ou investigados em ações de corrupção escolhendo o Presidente da República em eleições indiretas que devemos mudar a Constituição. Isso é casuísmo.

O casuísmo de hoje gera precedente para o casuísmo de amanhã. Isso dá margem a que poderosos políticos e econômicos façam o que quiser no Brasil. Não há justificativa para se deixar de aplicar as normas constitucionais a ferro e fogo. Se o Rodrigo Maia ou o novo Presidente da República eleito indiretamente, sob as regras atuais da CF/88 fizer besteira, que responda também como Collor e Dilma responderam e como Temer está prestes a iniciar seu périplo para responder.

Em todo caso, não se deve mudar a Constituição, pois senão não teremos nunca uma Constituição respeitada como tal. No exterior, meu antigo professor de Direito Civil, Silvio Capanema, pediu em uma livraria  francesa o exemplar da Constituição Brasileira, em torno dos anos 90, pouco após a promulgação de nossa atual Constituição. Ele pediu por curiosidade, já que viu que a livraria tinha vários exemplares de vários países. O dono respondeu: "vendemos Constituições e não semanários e almanaques".

Então, gente, vamos respeitar nossa Constituição para que as respeitem também.

6 comentários:

  1. Permita-me discordar. Acho que nenhuma constituição é imutável. Claro que o ideal é mexer o menos possível, mas se ocorrer alguma situação que exija a mudança na constituição, em favor de um bem maior ao povo e for vontade da maioria da população, então que mude-se a constituição.

    A ordem democrática e de direito já foi quebrada em 2015, quando o legislativo federal, por interesses politiqueiros, não deixou o executivo federal governar. Foi quebrada quando o presidente da câmara dos deputados aceitou um pedido de impeachment motivado por puro revanchismo, num claro desvio de finalidade. Foi quebrada quando Dilma foi "impichada", em um processo cheio de dúvidas em relação ao cometimento ou não de crime por parte dela. Foi quebrada quando não foi observada a retirada dos direitos políticos de Dilma depois de cassada (como já citado por você).

    Além disso a cassação da chapa Dilma-Temer, declararia o resultado das eleições presidenciais de 2014 inválido e portanto a lei eleitoral poderia ser vista nessa situação. Ou seja, poderíamos ter novas eleições sem mudar a constituição.

    Além do mais, o despeitado francês que zombou da nossa carta magna, deveria olhar para o país dele antes, que não é lá um grande exemplo de manutenção de constituições.

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    1. Rodrigo, meu caro, respeito a sua opinião sobre desvio de finalidade do impeachment. Já foi abordado esse tema em artigos próprios no Blog. O tema é cinzento. E nos posicionamos pela regularidade do impeachment, cientes de que a outra corrente tem bons argumentos.

      Reafirmamos nossa opinião de que as mudanças da Constituição em momentos de crise, em momentos graves, sem respeito ao procedimento ordinário que gera o debate consciente e honesto sobre problemas concretos ocasionados por determinadas normas constitucionais, são um risco par a democracia e geram alterações açodadas e casuístas. É contra isso que nos levantamos.

      Somos particularmente a favor da condenação da chapa-DIma-Temer e que o Temer perca a Presidência da República. Em seguida, deve ser seguido o rito que a nossa Constituição determina, sem surpresas de modificações ao sabor do momento como muitos querem, e nesse caso, deve haver as eleições indiretas.

      Isso é praticar a nossa Constituição. Isso, para nós, é o correto, sem desmerecer qualquer posição em contrário. Mas não se pode apontar uma saída (seguir a constituição sem muda-la) sem excluir os fundamentos legitimadores da outra saída (criar as diretas já para o caso atual em surpresa à regra existente).

      Acreditamos termos sido claros sobre a posição do Blog no tema.

      Grande abraço.

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  2. Mário,

    Peço, mais uma vez, com o máximo perdão em discordar com veemência de vossa explanação. Inclusive, peço a parte para comentar a alguns pontos de extrema provocação, nas principais:

    1 - Não existe subversão aos princípios constitucionais o "povo" buscar, nos termos da própria Constituição, diretamente ou neste caso pelos seus próprios representantes eleitos no Congresso Nacional, seus anseios para o regime de Poder desta República, como explanado noutro comentário, infelizmente não debatido, o que a premissa máxima da própria Carta lhe reserva como supra;

    2 - Não há absurdo, nem tanto subversão aos preceitos constitucionais, hipoteticamente, como se os leitores fossem ignorantes (no sentido da falta ou abstração de um conhecimento técnico por conveniência política, seria um insulto) o suficiente para formar suas convicções a partir, inclusive, de uma vasta literatura que o dia-a-dia se apresenta com excelência para este debate por renomados juristas. Nem mesmo abstrair a relevância intelectual por formação acadêmica daqueles que investem seu tempo com o interessante "blog";

    3 - Tornar lúdica, como alienação, ou agradável à defesa para os partidários inclinados ao "tucanismo" no foco (como cerne da questão) de que tudo gira em torno da eleição de "Lula" é um absurdo muito maior do que o próprio "casuísmo" alegado para justificar o afastamento do "Estado Democrático de Direito" pela evidência que hoje pauta-se, também, a dúvida de todo o processo democrático brasileiro desde a ocorrência da última eleição, inclusive, todos os fatos que ensejaram o "impeachment";

    4 - Outrora, "casuísmo" seria a previsão do art. 81 e parágrafos (como uma exceção ou ressalva) pelo Constituinte, em contraponto a preliminar diretiva prevista do §único do primeiro artigo da "Carta Magna" afastar qualquer possibilidade do oriundo "Poder emanado do Povo" num regime declaradamente democrático;

    Diante de tudo isso, não há o que se falar em "Lula". Isso somente está pautado na mente das pessoas de raso raciocínio (que tenho convicção que não é o sua, mas, sim, há um certa tendência coletiva de abordar desta forma) como a tendência influenciar um processo natural e democrático. Se fosse hoje, ou se será amanhã ou depois, em qualquer hora que houver a oportunidade, ou seja, é inafastável, PORÉM, A MESMA CONDIÇÃO VALE PARA QUALQUER CANDIDATO HABILITADO.

    (continua)

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  3. (continuando)

    Hoje, há um receio que ele volte, o que é lamentável que as pessoas discutam a soberania do interesse da maioria, aliás, foi exatamente com esse propósito que configuramos a atual situação. Então, que retornemos ao "feudalismo".

    O que se discute, e que tenho a certeza absoluta nas razão que fundamentam uma hipótese, sem medo de estar sozinho nesta luta, é de nunca tirar do "crivo" popular os destino político de uma nação. Como o melhor entendimento possível na observação do pleno "Estado Democrático de Direito".

    Tenho uma excelente memória e a certeza que já li em seus textos uma frase escrita por você, que diz: "Não existe nada mais sábio do que a autodeterminação de um povo".

    Mário, existe 92% de desaprovação do governo empoderado, a maioria da população quer "diretas", há um empresários (em colaboração premiada) afirmando mais 1890 políticos comprados, um Congresso completamente comprometido com um horda empresarial nefasta.

    Como elaborado e transcrito num comentário anterior, desde o caso do Arruda, no DF, o próprio STF, nos votos dos Ministros, manifestou a necessidade de qualificar as razões para regulamentar as hipóteses.

    A grande margem que se dá, ao tirar do povo (como premissa maior), para a perpetuação da plutocracia é justamente jogar nos braços de políticos com ela comprometida a legitimidade de operar um programa impopular que retirará todos os direitos garantidos aos cidadãos em benefício exclusivamente ao interesse privado. É somente isso que vemos desde então.

    Abraços, de um "cara" que te respeita e quer seu bem, por isso, talvez, esteja sendo chato. Abraços.

    Desculpe eventuais erros, escrevi de pronto, sem revisão.
    Fábio

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    1. Grande Fábio. Esse debate que eu, você e o Rodrigo travamos é o que incentiva o Blog e depura as ideias e conversações sobre o tema das novas "Diretas Já".

      A maior vantagem deste canal de comunicação que é nosso, é de coexistir respeitosamente as controvérsias sobre temas complexos.

      Sim, o tema foi abordado de forma mais simplificada desta vez. Mas devo dizer que foi, como todos os demais que o precederam, verdadeiro em seu conteúdo, apesar de poder o tema ser mais aprofundado, como as abordagens de vocês indicam e instigam.

      Eu só tenho lido e ouvido dois grupos que defendem a alteração constitucional: o grupo dos políticos enrolados com as operações de investigação de corrupção e delatados e seus partidos e os defensores da ocorrência do "golpe" contra o PT e a Dilma.

      A autodeterminação dos povos é primado básico. Mas o respeito à ordem constitucional garante o respeito à vontade popular expressa pelo povo através dos parlamentares constituintes.

      O conflito de princípios, então é evidente. COmo disse, o tema não é simples. Mas o artigo deve ter posição clara.

      Não tive nenhuma intenção de ser rude ao simplificar o artigo, mas a ideia e posição do Blog, no tema é clara. Esse era o objetivo.

      Mas pode ser que tenha ficado rude, porque tenho cada vez menos tempo para escrever e artigos rápidos têm o condão de não deixar o tema passar em branco, mas perde um pouco na qualidade da abordagem, reconheço.

      Mas aí entram os comentários e críticas. E vocês trazem à tona uma super contribuição para o tema.

      Mas chamo a atenção para algo maior e sobre o que ia abordar em outro artigo: Estão querendo uma Assembléia Constituinte. O programa televisivo do PTB foi todo em cima dessa ideia. Por quê? Porque o STF está consolidando entendimentos que prejudicam grandes interesses. Alterando a Constituição isso se altera em prejuízo da segurança jurídica e dos interesses coletivos e populares.

      A abordagem sobre o tema Diretas Já, que os que defendem o fazem no sentido de tentar trazer de volta uma oportunidade para um governo "deposto" (no fundo é isso), parte do pressuposto que a ordem constitucional já foi rompida (com o golpe), ideia da qual não compartilhamos, mas entendemos.

      Como não vemos a quebra constitucional, entendemos que as regras devam ser mantidas para que continue sua aplicação imediata e correta como vem sendo efetuado e para que haja uma continuidade da prática constitucional que leve à sedimentação das regras constitucionais e ordens originárias nela insculpidas.

      Essa é nossa visão e inspiração, a bem de todos. O que ocorria de mal só para o PT, agora está ocorrendo para o PSDB e PMDB também. Tudo sobre a mesma regra constitucional. Isso leva ao amadurecimento da prática constitucional e ao aclaramento do conteúdo das mesmas normas constitucionais aplicadas a todos esses casos análogos de corrupção.

      Neste sentido vemos a alteração da Constituição com muito receio e como um erro.

      Acho que nestes termos, fica mais clara nossa posição, com total respeito de qualquer outra, em especialíssimo, à sua, que sempre é de alto nível e regiamente embasada na técnica e na moralidade, ética e sempre com ótima retórica.

      Grande abraço.

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  4. É importante se entender que mudanças constitucionais, como o Rodrigo bem falou, podem ocorrer. Mas quando é requerida mudança constitucional em virtude de um certo problema que ocorre em um certo momento, fica evidenciado o casuísmo. Casuísmo não combina com democracia, pois na democracia o resultado é sempre incerto e as consequências são as mesmas para todos que estejam sob as mesmas condições de fato. Caindo Temer, a regra é de eleição indireta e Lula teria mais tempo para se apresentar como candidato. A mudança para diretas já surpreende totalmente essa situação.

    Mudanças constitucionais honestas se dão em debate de ideias, debate a finalidade e a eficiência de sistemas e procedimentos de forma mais abstrata e não com enfoque claro e determinado para que algo ocorra de determinada maneira em determinado momento.

    Quando a alteração é encomendada a um fim e propósito totalmente visíveis, trata-se de modificação das regras do jogo. Isso gera surpresa institucional, o que é proibido em jogo honesto dentro do Estado Democrático de Direito.

    Esse é o problema de se discutir a alteração das regras atuais de eleição indireta para Presidente da República, no caso de queda de Temer, para novas regras de eleição direta. Somente isso.

    Discutir a mudança de tais regras a partir do próximo mandato de 2018, por exemplo, não seria desonesto e nem antidemocrático.

    Essa é a nossa visão.

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