Hoje, 27/01/2011, vi o artigo de capa do Globo intitulado "Furnas fez negócios com firma ligada a deputado" com o subtítulo "Estatal pagou R$80 milhões por ações que valiam R$7 milhões". Naturalmente, como cidadão brasileiro, contribuinte e em dia com minhas obrigações tributárias, a primeira idéia que veio na minha cabeça foi "estatais e roubo... pô, eu pago imposto, eles criam estatais e estas aindam propiciam roubos?!?!?".
Lógico, que sendo como sou e sabendo o que sei, isso durou um milésimo de segundo e em seguida as outras informações que possuo começaram a atuar.
Sem entrar no mérito de se houve roubo, peculato ou malversação de dinheiro público ou não, pergunto: se Furnas fosse privada, essa notícia sairia no Jornal? Ou isso nunca aconteceria na área privada? Por que Furnas é estatal? Poderia ser diferente? O que é melhor para o País?
Vou, neste exato momento, compartilhar com vocês uma informação de fonte segura que os retirará do mundo dos sonhos da ética praticada nas empresas privadas para que vocês possam imaginar o mundo como é e avaliar o que é melhor para você, sua família e para o País. Ao fim você verá a diferença entre roubo na área privada e pública e será uma informação que mudará algumas ou muitas perspectivas suas.
Há muito tempo soube de algo que virou lenda na área jurídica e ao que soube é integralmente verdadeiro. Um diretor financeiro de uma grande instituição financeira privada (não estatal, é bom que se diga) foi a um grande escritório de advocacia desesperado por uma consulta. Um grande advogado o atendeu. o diretor então contou seu probelma:
- Desviei (sinônimo/eufemismo para "roubei") 2 milhões de reais do banco que dirijo. A auditoria descobrirá em dois meses os registros contábeis pertinentes. Este é o tempo que o senhor dispõe para empreender minha defesa. O que faço?
O advogado consterna-se. Reflete e, altissimamente competente e inteligente, pergunta:
- O senhor desviou dois milhões. Como o senhor tem liberdade para fazer isso?
- Doutor, o meu cargo me permite essa liberdade. Fiz várias vezes, para realizar negócios privado meus. Mas todas as vezes concluí com sucesso as operações anteriores, tendo a oportunidade de desfazer os registros e manter a normalidade. Desta vez a operação não foi exitosa e por isso não conseguirei desfazer, por isso aparecerá e daí meu problema.
- Então o senhor ainda pode fazer esse tipo de operação?
- Posso.
- Já sei como resolver. Ouça atentamente o que te direi: vá agora à sua empresa e desvie outros dois milhões. Traga aqui e em seguida lhe direi o que faremos para resolver sua situação.
- Mas vou me enrolar mais ainda!!! Pelo amor de Deus!!
- Se quiser a solução, faça agora, mas deve ser imediatamente e traga aqui.
Assim fez o diretor deseperado, confiante na solução jurídica que o grande advogado lhe ofereceria. Desviou mais dois milhões, com nervos à flor da pele, e levou para o advogado. Chegando lá o advogado falou:
- Um milhão é meu. Vou ligar para sua empresa, falar com o Presidente. Você admitirá o que fez e se desculpará. Dirá que desviou 4 milhões de reais, mas que pode devolver um milhão e que, para isso, como entende que não poderá permanecer como diretor financeiro desta empresa, requer uma carta de recomendação e pedirá afastamento por motivos particulares.
Assim, apesar de inicialmente o Presidente da empresa se negar, acabou vendo que se tomasse outra atitude o caso acabaria nos jornais. E quem é roubado pelo subordinado também é incompetente, o que poderia acabar com sua própria imagem e carreira. Além disso, aceitando a oferta, conseguiria de volta um milhão dos 4 milhões desviados. Recuperação de 25% do prejuízo. O acordo foi fechado. O presidente e os demais membros do conselho fiscal e administrativo concordaram (o Presidente não tinha roubado e não ia decidir sozinho). O diretor ladrão teve carta de recomendação e saiu limpo. A empresa resgatou 25% do prejuízo e salvou sua imagem. O grande advogado ganhou um milhão de reais.
Isso não saiu no Jornal. Você nunca saberá sobre os envolvidos. Mas os acionistas da empresa tiveram prejuízo e pessoas deveriam responder civilmente e penalmente.
Se a empresa fosse estatal, sua contabilidade poderia ser cotidianamente acompanhada por quem quisesse e a mídia publicaria. Mas como foi na área privada, a mídia não soube, mas prejudicaram-se a empresa e os acionistas. E não adianta dizer que sociedades anônimas pub,icam balanço e que acionistas têm direito de ver as contas e balanços, amigo. O acesso à contabilidade de empresas por direito de acionista é raro e somente das contas oficias (ou seja, já tratadas) e o que é publicado por Sociedades Anônimas é a conta oficial, como a Enron, AIG, o falido Lehmann Brothers e outras empresas privadas publicaram.
VocÊ consegue ver a diferença entre o roubo na área privada e na pública? Tudo o que você transforma em privado, amigo, fica no mundo privado. Você não vê o roubo, mas não quer dizer que não exista. Você não vê irresponsabilidade, mas não quer dizer que está sendo melhor gerida.
Se Furnas fosse privada, você acha que sairia esta notícia no jornal? A CVM tem vários processos andando sobre movimentações irregulares por informação privilegiada na área privada e você sabe quando você terá acesso a isso? Nunca.
Outra coisa, na área privada a liberdade de gerência é total. Você acha que não acontece de os executivos contratarem empresas terceirizadas de amigos, mesmo que talvez não seja o mais barato para a empresa? Não ocorre contratação de amigos, filhos de amigos, parentes, namorados de parentes? Ninguém leva percentual nestas contratações? Só que isso, amigo, não é apadrinhamento. Isso não é crime contra a administração privada. E também não é corrupção. Se você é executivo de empresa privada e contrata serviços ou efetua compras, mesmo que não sejam as mais eficientes, não é crime. Se aceitou oferta e vai levar percentual, mesmo que seja pego, não é crime.
Na área pública, como não poderia ser diferente, tudo isso gera responsabilidade cível, administrativa, mas ainda leva a responsabilidade criminal. Lógico. É dinheiro público envolvido. Quero mostrar que quando a atividade é realizada pela área pública, a segurança da sociedade é maior. Há mais fiscalização. Tudo tem prós e contras. Os prós de privatizar são basicamente: diminuir o Estado, retirar a empresa das amarras licitatórias e regras públicas, inclusive cirminais públicas, e retirar as garantias de estabilidade dos servidores dali (no caso de privatização de empresas públicas e sociedades de economia mista, o regime já é celetista). Mas vocÊ nunca mais vai ver o que acontece, amigo. Ou isso será muito dificultado. Às vezes vale a pena, dependendo da área de atuação (tem setores que não precisam da presença do Estado para se desenvolverem e serem úteis à sociedade), às vezes não vale.
Quando ler a matéria de hoje do Globo, não pense portanto que vocÊ foi traído pela estatal. Pense que por ser estatal, a possibilidade de que essa pretensa e ainda não comprovada maracutaia fosse fiscalizada e descoberta foi muito maior do que se fosse empresa privada. Deixe a imprensa em cima. Ela faz muito bem esse papel. E é importante que faça. Só não gosto quando ela tenta generalizar um problema ou um roubo para o grupo de estatais ou do funcionalismo público. Não pode uma coisa boa (investigação, publicização, fiscalização pública) gerar uma coisa ruim (perda de imagem e credibilidade no bom serviço e na necessidade de estatais onde são necessárias).
Todo empresário sabe que se não estiver na sua empresa, olhando, será roubado. E não é porque foi roubado que ele venderá sua empresa. O mesmo acontece aqui. Ficando de olho podemos coibir e descobrir maracutais e investigar e punir, mas isso não pode nos induzir a querer desfazermo-nos de nosso patrimônio, pois isso é o fácil e não necessariamente resolve o problema. Só o torna menos fiscalizável.
E no caso de Furnas. Pense. Por que não existe empresa totalmente privada geradora de energia elétrica? Por que praticamente todo o sistema ou mais de 90% do setor gerador de energia elétrica é estatal? Porque o investimento é caro, de retorno baixo e o serviço é essencial. Se uma empresa dessa falisse, privada ou não, quem arcaria no final das contas seria o Estado. Esse tipo de prestação de serviço à população é exatamente o tipo que deve ter presença do Estado: aquele em que não se pode admitir falência. Falências de grandes bancos são a única exceção a essa regra. Não se pode deixar falir o grande banco (em defesa da poupança dos clientes e da normalidade do mercado financeiro), mas não se pode estatizar o setor, sob pena de perda de produtividade e prejuízo para a própria sociedade. Além de que seu tamanho no Brasil é gigante e impossível, a meu ver, de ser gerido somente pelo Estado.
Ocorreu roubo em Furnas? Apure-se, investigue-se e, se for o caso, puna-se. A punição é maior do que se Furnas fosse privada. Estamos protegidos. O interesse público está protegido. Isso é para mim, o símbolo maior do significado de uma estatal e de todas as estatais.
Mário, no penúltimo parágrafo, também pode ser exemplificado, quando da privatização dos serviços públicos, restaram todas as companhias de água e esgoto dos estados e nenhuma foi privatizada, nem foram colocadas em pauta, pois já sabiam que não haveria interesse de ninguém. Não há lucro!
ResponderExcluirNo mesmo parágrafo, também, na questão das empresas concessionárias e dos bancos, explicita a maior diretiva liberal que é "A Privatização do lucro e a socialização do prejuízo". O empresário capitalista vê o "filé" e quer comê-lo, porém, antes comprá-lo o desqualifica ao patamar de "pescoço", deleita-se da aquisição, mas se alcançar a falência pede assistência ao Estado sob risco sistêmico. Quem paga? Somente aqueles que pagam impostos... já quem sonega não é alcançado.
Mas as regras têm as suas exceções:
Explicáveis, lógico!
Temos um exemplo muito recente que é o caso do Banco Panamericano ... faço remissão ao seu texto "Todo empresário sabe que se não estiver na sua empresa, olhando, será roubado." ... para dizer: - "Coitado do Abravanel!" ... foi roubado! Assim reforço a sua teoria com um contra-senso da mesma ... o banco é privado e paga publicidade na mídia ... Ah! Mas é do SILVIO SANTOS, né!!!
O banco dele estava sendo sistematicamente roubado e a fraude foi descoberta devido à atuação do Estado na fiscalização de uma autarquia federal, que neste caso estava sendo conduzida por funcionários públicos federais (pressupostamente e provavelmente) ilibados.
O contra-senso desta ocasião é que como o principal acionista e controlador têm um vasto patrimônio nacionalizado (digamos assim, pois seus negócios são evidenciados por preferência ao Brasil), então, a Autarquia conduziria o processo à liquidação e não a recuperação com recursos especialíssimos, logo, pela primeira vez na história, uma instituição recorreu ao FGC (Fundo Garantidor de Crédito - Associação civil PRIVADA, portanto, não governamental) a fim de salvar o seu patrimônio e ter a sua chance.
Detalhe:
O FGC foi criado em novembro de 1995 com o objetivo de ressegurar os depósitos em conta corrente nos bancos afiliados e afastar risco sistêmico. O fato relevante foi que a partir desta data, 11 (onze) bancos quebraram e todos eram associados ao fundo, mas essa conta caiu em todos os casos no PROER justamente porque não podiam liquidar os ativos patrimoniais daqueles sem algum no país e, mesmo com a forte atuação do MPF em alguns dos casos, conseguiram HC dos Mello e Mendes da vida e correram para a Europa.
Devo reforçar que o FGC é um fundo criado por um associação civil privada!